A linha do tempo dos Direitos Humanos até a agenda ESG

A linha do tempo dos Direitos Humanos até a agenda ESG
Fabio Rivelli comenta sobre a forma como os Direitos Humanos e o ESG devem caminhar lado a lado. Confira a matéria completa.

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Desde o ano passado, o Comissariado Europeu para a Justiça vem propondo introduzir regras legislativas sobre direitos humanos obrigatórios dentro da cadeia de abastecimento global das empresas da União Europeia. É uma espécie de Green New Deal dos europeus visando identificar, mitigar e enfrentar os abusos aos direitos humanos e questões ambientais no mundo corporativo. A iniciativa teve à frente mais de 100 Organizações Não Governamentais (ONGs) e outras entidades, que se apoiaram no argumento de que sem dispositivos que especifiquem como as empresas devem detectar e tratar os impactos dos direitos humanos e do meio ambiente, elas ficam impedidas de ser responsabilizadas legalmente.1

Enfim, a ruptura com um mundo não sustentável torna-se fundamental para implantar as práticas ESG ( Environmental, Social and Corporate Governance). Até então, inúmeras e louváveis iniciativas de fundações, sociedade civil, institutos, setor privado, ONU, entidades de pesquisa dentre outros, não tinham alcançado o impacto social, ambiental e de gestão esperados. Mas a demanda da sociedade mudou e a economia da sustentabilidade acaba de atingir um patamar jamais alcançado. Percebe-se uma condição semelhante à abordada na “teoria do caos”, pela qual “o simples bater das asas de uma borboleta no Brasil pode ocasionar um tornado no Texas”. Essa frase emblemática do meteorologista Edward Loren, expressada há mais de 60 anos, não pode ser tomada literalmente, mas interpretada metaforicamente, qual seja: pequenas alterações em um sistema caótico podem tomar proporções grandiosas, alterando as condições iniciais. Essa, creio, pode ser a base da sustentabilidade e do engajamento para termos uma economia mais sustentável e consequentemente gerar lucro e impactos positivos de ordem planetária.

O chamado “Efeito Borboleta” já está presente, porque temos a sensibilidade das condições iniciais para desencadear mudanças amplas. É o caso do fator “ S” na cultura ESG, que vem abarcando os direitos humanos, que tendem a ser incorporados voluntariamente pelas políticas das corporações. Sua base está nos Princípios Orientadores sobre Negócios e Direitos Humanos da ONU (UNGPs,2011) 2e diretrizes da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)3 “A responsabilidade das empresas de respeitar os direitos humanos refere-se aos direitos humanos internacionalmente reconhecidos – entendidos, no mínimo, como aqueles expressos na Carta Internacional de Direitos Humanos e os princípios de direitos fundamentais estabelecidos na Declaração da Organização Internacional do Trabalho sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho”, destaca a UNGPs.

Assim como as empresas precisam ter uma política de negócios éticos, buscando estar em conformidade com as leis anticorrupção; precisam igualmente respeitar as leis sobre direitos humanos. O desenvolvimento dessa consciência vem de iniciativas como a AGENDA 2030, reconhecida em 2015 pelos 193 Estados- membros da ONU. O comprometimento abarcou a necessidade de tomar “ medidas ousadas e transformadoras para promover o desenvolvimento sustentável nos próximos 15 anos, sem deixar ninguém para trás.” 4

Se entendermos que os direitos humanos asseguram a dignidade da pessoa humana, podemos afirmar que permeiam todos os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentáveis (ODS) da Agenda 2030 da ONU: erradicar a pobreza; fome; garantir boa saúde e bem-estar; educação de qualidade; igualdade de gênero; água potável e saneamento; energia acessível e limpa; trabalho decente e infraestrutura; reduzir desigualdades; ter cidades e comunidades sustentáveis; consumo e produção responsáveis; ação climática; vida abaixo da água; vida na terra; paz, justiça e instituições fortes e, por fim, parcerias para os efetivas os ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável), “baseado em um aprimoramento e cooperação de planos nacionais para buscar o sistema de comércio equitativo, baseado em regras universais que seja, justo aberto e beneficie a todos.”5

A dignidade da pessoa humana deve ser entendida como a “qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existentes mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos”. 6

A dignidade da pessoa humana tornou-se um direito fundamental e um dos alicerces dos direitos humanos, consagrado na maioria das Constituições de países democráticos e um valor a ser priorizado na agenda ESG.

Assim como a teoria do caos estabelece que uma pequena mudança no início de um evento pod e ter consequências amplas e desconhecidas; a integração da agenda ODS em dezenas de projetos podem ter resultados surpreendentes, que podem ser acompanhados pela plataforma Sparkblue, desenvolvida para a integração da comunidade engajada no Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas (PDNU). Nesta plataforma temos vários exemplos de iniciativas que buscam as metas estabelecidas pelos 17 ODS: (i) em Angola, um programa de gestão de recursos naturais para a conservação e desenvolvimento econômico; (ii) na Bolívia, um redesenho da vida urbana em La Paz para melhorar a mobilidade, serviços públicos e redução da poluição no ar; (iii) no Paraguai, medidas para a contenção da propagação da pandemia causada pelo Covid-19, que superaram rapidamente o risco de grandes proporções de pessoas ligadas a empresas pequenas e médias caírem na pobreza, implementando um plano de orientações, atividades comunitárias que disponibilizam equipamentos médicos, refeitórios, o projeto se chama “Todos por Paraguai”. 7

Os ODS e planos do PDNU, agora ligados às práticas ambientais, sociais e de governança estabelecidas pela agenda ESG, auxiliam a nortear os investimentos e, sua consequente manutenção, tem probabilidade de gerar novos frutos, embora ainda estejamos diante do pêndulo caótico, no qual cada imã segue sua trajetória. Em artigo/crônica publicado recente (“ ESG e SDG num dia de Diana”)8, os autores demonstram como se aplicam os fundamentos da agenda ESG no cotidiano, indicando onde cada sigla se enquadra. E, a exemplo da “teoria do caos”, também podemos prever no mundo atual da crise sanitária e dos impactos da pandemia de Covid-19 (sistema caótico) que – a partir da inserção dos direitos humanos e dos ODS nas políticas das organizações – isso pode gerar consequências positivas para toda a humanidade.

1- Disponível em https://www.business-humanrights.org/en/latest-news/over-100-civil-society-
organisations-call-for-eu-human-rights-and-environmental-due-diligence-legislation/

2- Disponível em https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2019/outubro/disponibilizada-a-cartilha-referente-aos-principios-orientadores-sobre-empresas-e-direitos-humanos

3- Disponível em http://mneguidelines.oecd.org/RBC-LAC-Joint-project-presentation-Portugue%CC%82s.pdf

4- Disponível em https://www.undp.org/sustainable-development-goals?

5- Disponível em www.undp.org

6- Sarlet, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição
Federal de 1988, pág 60.

7- Disponível em https://sdgintegration.undp.org/sparkblue?utm_source

8- Disponível em https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/esg-e-sdg-num-dia-da-
diana/