ESG e Gestão de Planos de Saúde: Uma Abordagem Integrada

ESG e Gestão de Planos de Saúde: Uma Abordagem Integrada
O estabelecimento de uma política de ESG pode ajudar a reduzir o percentual de demandas judiciais do setor de planos de saúde.

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A frase “Não há empresa saudável em um planeta doente”[1] é bastante popular no universo da sustentabilidade colaborativa e, no âmbito do setor de saúde, representa fielmente a realidade. O mercado de planos de saúde, considerado problemático, apresenta índices associados à alta judicialização de demandas dos consumidores no Brasil. Além da falta de transparência e prestação de contas das operadoras, que geram desconfiança e insatisfação entre os clientes, há reclamações recorrentes sobre a dificuldade de acesso a procedimentos e tratamentos, muitas vezes questionados pelas próprias operadoras.

No entanto, como a melhoria da saúde do planeta pode impactar o setor de planos de saúde? Essa é provavelmente a primeira pergunta feita ao tentar relacionar práticas de sustentabilidade e governança com a rotina das operadoras. É importante observar que no ESG (Environmental, Social and Governance) figura uma nova abordagem para a gestão empresarial, destacando questões ambientais, sociais e de governança corporativa.

Assim, a implementação de padrões de governança mais rígidos, incluindo a divulgação de relatórios financeiros e de impacto socioambiental, pode aumentar a transparência das operadoras em relação às suas atividades e resultados, fortalecendo a responsabilização perante seus clientes e a sociedade em geral. Adicionalmente, a adoção de práticas sustentáveis e éticas pode levar a uma maior eficiência operacional, redução de custos e aprimoramento na gestão de riscos, impactando diretamente na qualidade dos serviços prestados aos consumidores e trazendo benefícios ambientais e sociais.

O estabelecimento de uma política de ESG pode, inclusive, ajudar a reduzir o percentual de demandas judiciais do setor de planos de saúde, uma vez que sua normativa e princípios tendem a incentivar a resolução de conflitos por vias extrajudiciais. Foi pensando em todos esses benefícios e perspectivas positivas que a ANS publicou, no último dia 21 de março, a Resolução Administrativa 82, estabelecendo sua Política Integrada de Governança e Responsabilidade Socioambiental.

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Embora a resolução trate especificamente das ações da agência em relação à agenda ESG, há diversos pontos importantes a serem destacados. Entre eles estão o apoio ao desenvolvimento nacional sustentável e à responsabilidade socioambiental, a busca pela equidade, diversidade e inclusão, a integridade e transparência, a prestação de contas e o alinhamento da gestão estratégica, tática e operacional aos 17 ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável).

A política apresenta as diretrizes que visam garantir o cumprimento das normas regulamentares, bem como de outros requisitos relacionados à governança e ao desenvolvimento sustentável. Segundo o seu art. 4º, a ANS deve estabelecer mecanismos de liderança, estratégia e controle, promovendo a inclusão social, atraindo e retendo talentos alinhados com seus valores por meio de soluções inovadoras e a gerenciamento de riscos.

Se ainda restam dúvidas para as operadoras de planos de saúde, estudos recentes da Harvard Business Review[2] demonstram que empresas que adotam a agenda de crescimento sustentável e estabelecem estratégias para atingir os ODS são percebidas como mais confiáveis por investidores, consumidores e colaboradores. Ademais, o Boston Consulting Group, em parceria com a Sustainable Trade Initiative, apontou que empresas que adotam a sustentabilidade em seus negócios podem aumentar seus lucros em até 12%[3], o que evidencia que a adoção de atitudes pró-ambiente podem reduzir custos operacionais, minimizar riscos e aprimorar a reputação das empresas.

É relevante ressaltar, ainda, que a ANS tem estabelecido normas de governança que possuem caráter vinculativo, como é o caso da Resolução Normativa 518/2022, que estipula a adoção de práticas mínimas de governança corporativa, com ênfase em controles internos e em gestão de riscos, visando garantir a solvência das operadoras de planos de assistência à saúde.

Por isso, é de responsabilidade das empresas que oferecem planos de saúde repensar suas estratégias a fim de se alinharem com as expectativas e projeções da autarquia. Embora não haja uma lei específica que obrigue as companhias a adotarem práticas ESG, há iniciativas em discussão que podem tornar essa adoção obrigatória em alguns setores. Assim, a Política Integrada de Governança e Responsabilidade Socioambiental representa um avanço significativo nesse sentido.

Em resumo, as empresas de assistência complementar devem ser atraídas para adotar princípios ESG não apenas para exercerem um papel ativo na implementação de práticas sustentáveis, mas também para garantirem sua própria sobrevivência em um ambiente corporativo cada vez mais competitivo e consciente. É crucial que essas empresas reconheçam a importância da sustentabilidade ambiental, social e de governança como fator-chave para sua resiliência, reputação e desempenho financeiro a longo prazo.

Por conseguinte, a iniciativa da ANS ao estabelecer a Política Integrada de ESG é um alerta fundamental para que o setor de planos de saúde contribua para um planeta mais saudável e uma sociedade mais justa e inclusiva, fortalecendo assim sua posição no mercado e sua responsabilidade social.


[1] GILBERT, Jay Coen. The Power of Impact Investing: Putting Markets to Work for Profit and Global Good. John Wiley & Sons, 2011.

[2] ECCLES, R. G.; SERAFEIM, G. The Performance Frontier: Innovating for a Sustainable Strategy. Harvard Business Review, v. 91, n. 5, p. 50-60, May 2013. Disponível em: https://hbr.org/2013/05/the-performance-frontier-innovating-for-a-sustainable-strategy. Acesso em: 29 abr 2023.

[3] ACCENTURE. The Business 2°C Challenge: 10 years to take action. Accenture, 2018. Disponível em: https://www.accenture.com/_acnmedia/PDF-84/Accenture-The-Business-2C-Challenge-10-Years-To-Take-Action.pdf. Acesso em: 29 abr 2023.

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RAYANNE CONCEIÇÃO DE ALMEIDA SANTOS – Advogada da Lee, Brock, Camargo Advogados, pós-graduada em Direito Digital pelo Ceped/UERJ em parceria com o ITS-Rio (Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio) e graduada em Direito pela UNESA